Qual o nível da tomada de decisões dos lideres?
Em pouquíssimas atividades as pessoas têm tanta experiência quanto na tomada de decisões. Tomamos dezenas, talvez centenas de decisões por dia.
Dado o bombardeio de informações e a quantidade de solicitações no mundo atual, praticamente todo ser humano pode se orgulhar de ser um especialista em decisões. De fato, pouquíssima gente considera que tenha o que aprender nesse campo. Infelizmente, nem sempre nossa opinião sobre nós mesmos condiz com a realidade. A experiência ensina muito, mas é má professora: custa caro e nos inculca maus hábitos junto com os bons.
Executivos, em especial, crêem ser decisores decididos e decisivos. Afinal de contas, não é o mundo empresarial um campo de decisões por excelência, e decisões postas à prova pelo mercado? O que é gestão, senão analisar situações, estudar possibilidades, fazer escolhas e implementá-las? O que é a empresa, senão um local onde impera a racionalidade, em prol da produção de bens e da prestação de serviços?
Sob essa perspectiva, os processos de decisão no mundo corporativo deveriam ser simples, objetivos, eficientes. Mais uma vez: infelizmente, nem sempre os mitos em que acreditamos condizem com a realidade.
É o que indicam vários estudos sobre processos de decisão, como os exemplos a seguir: Metade das decisões tomadas nas empresas fracassa.
Este é o resultado de duas décadas de pesquisas do professor Paul Nutt, do Fisher College of Business, da Universidade de Ohio. Nutt estudou mais de 400 decisões de executivos dos Estados Unidos e do Canadá sobre lançamento de produtos, compra de equipamentos, contratações, política de preços, atendimento etc. As conclusões dele são uma pedrada na imagem dos executivos como grandes decisores.
Nutt percebeu que as melhores táticas de tomada de decisão são as menos usadas. Além disso, constatou que o processo formal de tomada de decisões raramente é seguido. Os administradores costumam pular direto para as conclusões e tentar implementá-las. Isso os faz limitar a pesquisa de dados, considerar poucas alternativas (na maioria das vezes, uma só) e prestar pouca atenção nas pessoas afetadas por suas decisões.
63,4% das decisões de executivos são tomadas pela fuga do problema, segundo pesquisa com 2 476 gerentes de 21 empresas japonesas, feita por Nobuo Takahashi, professor de administração da Universidade de Tóquio. Decisão por fuga é quando o responsável demora tanto para agir que o problema se resolve sozinho – para o bem ou para o mal. Esse método se opõe à decisão por resolução (a típica, nas teorias clássicas) e à decisão por previsão (quando se engatilha a solução como precaução para um possível problema).
Para gerentes que têm entre 30 e 39 anos, supostamente a fase mais enérgica da carreira, a taxa de decisões por fuga sobe para 83,2%, segundo o estudo. As informações que as empresas buscam com maior afinco são as menos aproveitadas na hora de tomar a decisão, segundo a administradora brasileira Valéria Noguti, em sua tese de mestrado pela USP.
No estudo do processo de desenvolvimento de novos produtos e serviços em 11 empresas, ela concluiu que a busca por informação recorre, pela ordem, às seguintes fontes: consumidores ou clientes, experiência dos funcionários, outros projetos da empresa e concorrentes. Mas, na hora de aproveitar as informações, a ordem de importância das fontes se altera para: experiência dos funcionários, sistemas de informação da empresa, concorrentes e, por último, consumidores ou clientes. Ou seja, há um descasamento entre o processo formal de tomada de decisão e como a decisão efetivamente ocorre. “A intuição é responsável pela definição da escolha final em grande parte das decisões corporativas, porém a maior parte dos entrevistados citou que a empresa valoriza mais os dados que a experiência das pessoas”, escreveu Noguti.
Metade das atividades diárias de executivos-chefes de grandes empresas dura menos de 9 minutos, e apenas 10% excedem 1 hora, afirma o guru de administração Henry Mintzberg, da Universidade McGill, em Montreal, que acompanhou a rotina de cinco CEOs americanos. Da mesma forma, um estudo com 160 gerentes britânicos concluiu que eles trabalhavam mais de meia hora seguida apenas uma vez a cada dois dias. “Nenhuma evidência apóia o mito de que o executivo é um planejador sistemático e reflexivo”, afirma Mintzberg. Para ele, o mais correto é dizer que os gerentes passam o tempo todo reagindo às pressões do cotidiano.
Os executivos gastam entre 66% e 80% do seu tempo em conversas, diz Mintzberg, no livro Mintzberg on Management (Mintzberg fala sobre gestão), citando dois estudos britânicos. Na sua pesquisa com cinco presidentes de empresa, eles responderam apenas 2 dos 40 relatórios que receberam em cinco semanas. “Ao contrário do mito de que executivos adoram informações padronizadas obtidas com sistemas formais de coleta de dados, estudos sugerem que eles apreciam muito mais a informação leve, especialmente fofocas e especulações”, afirma Mintzberg.
Os executivos não enxergam o problema, eles propõem uma solução. Tanto na observação da rotina de executivos quanto em experiências em que lhes apresentava casos para resolver, o professor Michel Fiol, da École des Hautes Études Commerciales (HEC), uma das mais renomadas escolas de administração da França, observou que eles raciocinam primeiramente em termos de solução e só então é que tratam de encontrar um “problema” em que ela se encaixe. “Os executivos diagnosticam o problema. Mas, quando fazem isso, é porque já têm a solução”, diz Fiol. É exatamente o caminho inverso do que dita a teoria clássica de tomada de decisões. “Essa mentalidade de solução se materializa sobretudo como uma grande confusão entre o que sejam a situação, o problema, as causas, as manifestações, os sintomas, as soluções…”, diz Fiol, no que será um dos capítulos do livro La Formation des Dirigeants a-t-elle un Sens? L Apport de la Recherche (A formação dos dirigentes tem um sentido? O que diz a experiência).
Decisões em grupo, em vez de atenuar extremismos e diluir o risco, tendem a enxergar menos perigos. Em geral, grupos apresentam comportamento de risco maior do que as preferências de seus integrantes fariam supor. Vários estudos identificam o fenômeno da “polarização”: as discussões costumam potencializar a visão predominante dentro do grupo. Isso torna as decisões coletivas ainda mais suscetíveis às armadilhas de tomada de decisão.O risco é maior nos grupos mais coesos, que tomam decisões secretas, sujeitos a estresse e sob uma liderança forte – justamente o caso da maioria dos grupos de direção das empresas. Neles, as pessoas são mais propensas a ter autocensura (as vozes discordantes têm medo de parecer ridículas ou atrasar o trabalho), há uma forte pressão para atingir o consenso rapidamente, misturada com uma ilusão de invulnerabilidade (quanto mais sucesso tiver o grupo, maior o risco de achar-se invencível) e uma tendência a estereotipar situações.
“O caso mais famoso de pensamento de grupo é o desastre da nave espacial Challenger, que explodiu ao ser lançada, em 1986”, diz Abraham Yu, que ensina análise de decisões na pós-graduação de administração da USP. A pressão pelo resultado e o consenso exagerado fizeram com que eles não prestassem atenção nos sinais que alertavam para o perigo. Cada um dos estudos citados acima representa um baque no mito de que as empresas seguem um modelo racional e criterioso para escolher seus caminhos. Isso não significa que o processo de decisão esteja condenado desde o início a uma tomada de posição intuitiva.“Certamente a intuição tem suas vantagens”, diz o professor de análise de decisões Paul Thagard, do departamento de filosofia da Universidade de Waterloo, em Ontário, no Canadá. “Uma delas, óbvia, é a velocidade.
Outra é que as decisões levam em conta o que realmente importa para você. Uma terceira vantagem: a decisão assim tomada leva diretamente à ação.” Num estudo com 60 diretores de empresas dos Estados Unidos, feito pela consultora Monica Miller e pela professora de administração Lisa Burke, da Universidade da Louisiana, 47% disseram usar a intuição “com freqüência”, 30% “às vezes” e 12%, “sempre”. Pesquisadores dizem que altos executivos são obrigados a confiar mais na intuição, porque as decisões que tomam são mais conceituais e eles geralmente lidam com situações únicas, em que não há muitos dados para orientação. Mas confiar na intuição é problemático. “Uma opção pode parecer atraente porque não consideramos outras. Podemos sentir uma atração irresistível por uma opção que nos viciou – e nos impede de satisfazer outros desejos. A decisão intuitiva pode se basear em informações não acuradas ou irrelevantes. Finalmente, ela se torna um problema em situações de grupo: como justificá-la?”, diz Thagard. Ainda mais do que isso: decisões baseadas na intuição podem ser incoerentes.
Num estudo americano, psicólogos mostraram 96 radiografias de estômago a 5 radiologistas e pediram que eles avaliassem a presença ou não de úlcera. Uma semana depois, mostraram-lhes as mesmas radiografias, em ordem diferente. As opiniões mudaram de uma semana para outra, dependendo do médico, entre 8% e 40% das vezes. A intuição pura está de um lado do espectro do processo de tomada de decisões. Do outro lado está a análise absolutamente racional das alternativas, a comparação com critérios previamente estabelecidos e a escolha daí decorrente. Os dois opostos têm uma característica em comum: não existem na vida real. Mesmo a mais pura das intuições tem de se basear em informações racionais – por menos explícito que seja o conhecimento do decisor.
Quanto à análise racional, o americano Herbert Simon, pesquisador de tomada de decisões nas organizações, ganhou um Prêmio Nobel de economia em 1978 por estudos do final da década de 50, em que demonstrava o princípio das limitações à racionalidade. Estudiosos do campo aberto por ele afirmam que, no mundo real, é impossível coletar todas as informações, considerar todas as conseqüências ou mesmo esclarecer todas as preferências. Em vez de considerar todas as alternativas, os decisores tipicamente consideram apenas algumas, e não as analisam simultaneamente, mas uma de cada vez.
Na prática, não calculam a “melhor ação possível”, e sim uma ação que seja “boa o bastante”. O fato de haver limitações – e muitas – não significa que não se deva tentar tomar decisões da forma mais racional possível.
Na última década, foram desenvolvidos vários programas de computador que facilitam a análise de alternativas, dão-lhes peso relativo (mesmo que tenham avaliações subjetivas) e calculam a opção mais vantajosa. “Análises que, há 15 anos, levaríamos semanas para fazer, hoje podem ser feitas em dias”, afirma Ronald Howard, professor do departamento de sistemas de engenharia econômica da Universidade Stanford e sócio da consultoria Strategic Decisions Group.Mas mais importante do que os programas com modelos matemáticos pesados é entender o que se está fazendo. “O software ajuda, mas tem de entender do que se trata um processo de decisão. Se não, é pior do que ser intuitivo: o sujeito pode achar que está tomando uma decisão racional, mas está se entregando ao acaso”, diz Abraham Yu, da USP.
É aí que entra o bê-á-bá das teorias normativas de decisão. Há, principalmente nos Estados Unidos, um sem-número de métodos para tomada de decisão. Mudam os autores, mas o passo-a-passo recomendado é mais ou menos o mesmo:
1) Defina o problema, o propósito geral da decisão;
2) Identifique os critérios que você vai usar para avaliar as alternativas, ou seja, estabeleça as metas que quer atingir;
3) Dê peso aos critérios, ordenando suas metas por importância;
4) Busque informações que gerem alternativas de solução;
5) Dê nota às alternativas, segundo os critérios; e
6) Calcule a melhor alternativa.
“Esses itens são todos óbvios, mas a minha experiência é que as pessoas se confundem”, diz Yu. “A teoria normativa não é só um modelo matemático. Tem uma arte de enquadrar o problema, que é a coisa mais importante.” Por falta dessa arte é que a maioria dos conselhos de administração e diretorias de empresa se perde em discussões inócuas. “Nas reuniões nas empresas, é comum não estarem as pessoas que deveriam decidir. Vão os que têm mais status”, diz Thomaz Wood Jr., consultor de estratégia e professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.
“A maioria das reuniões também não tem locação de tempo para as discussões. Os executivos ficam horas falando, sem ouvir um ao outro. No final, sobram 10 minutos para resolver uma pauta de 15 itens”, diz Wood. É claro que não basta seguir o passo-a-passo.
A teoria normativa indica a direção em que o decisor quer ir, mas há inúmeros obstáculos no caminho. É importante conhecê-los, não para invalidar o processo mas para se precaver. Alguns desses obstáculos estão citados nos quadros ao longo desta reportagem. Há vários outros, muitos de origem psicológica. Por exemplo: “Decisores procuram informações, mas eles vêem o que esperam ver e não prestam atenção ao inesperado”, diz o sociólogo James March, professor de gestão na Universidade Stanford e autor do livro A Primer on Decision Making (Introdução à tomada de decisões).
Outro exemplo: decisores têm uma tendência a coletar quilos de informações apenas para sentir-se mais seguros da escolha que fizeram no primeiro momento. “A confiança aumenta com o acréscimo de informações, embora a acurácia em geral não fique mais elevada”, diz March. Para lidar com todas as armadilhas no processo de tomada de decisão, não há outro meio a não ser ficar atento e tentar compensar a tendência a incorrer em vícios de pensamento. A começar, talvez, pela sua personalidade. “Cada pessoa inicia o processo de decisão por um ponto diferente”, diz João Mendes de Almeida, da consultoria de recursos humanos DBM.
“Um tipo afetivo sempre pensa primeiro no impacto da decisão sobre as pessoas. O reflexivo analisa o quadro geral antes de mais nada. O racional tenta dar conta de dados objetivos. Um pragmático tende a ir direto para a implementação. É importante a pessoa conhecer suas características, para compensar o viés que naturalmente tem para olhar um problema.” Com grupos acontece algo parecido. “Se o processo de decisão fosse totalmente racional, a configuração de indivíduos nos subgrupos mudaria a cada item a ser decidido. Mas, na maioria das vezes, as coalizões são estáveis”, diz Jack Wood, professor de comportamento organizacional do IMD, a escola suíça de administração e negócios, com sede em Lausanne.
Para Wood, uma rápida medida da racionalidade das decisões do grupo é quão livremente seus membros trocam de filiação. “Decisões em grupos de coalizões fixas são menos sobre o assunto que está na mesa do que sobre assuntos que estão debaixo da mesa”, afirma. “E o que opera debaixo da mesa são estruturas emocionais.” Todas essas regras e cuidados têm o sentido de buscar o melhor resultado possível em cada problema. Dentro dessa lógica, decidir é avaliar conseqüências.
Há, porém, uma segunda forma de entender o processo de decisões: como uma lógica de aprendizado de comportamentos e apropriação de identidade. Segundo essa teoria, o processo mental pelo qual passa um decisor não é de avaliação de alternativas, mas sim de reconhecimento da situação (“o que está acontecendo?”), caracterização da identidade (“que tipo de pessoa sou, ou que tipo de organização é esta?”) e cumprimento de regras (“o que uma pessoa como eu faz numa situação como esta?”).
“Durante o processo de tomada de decisões, os executivos desenvolvem e comunicam sentido não apenas sobre a decisão mas também sobre verdades, moral e comportamentos aceitáveis. Eles elaboram uma linguagem e descrevem como as ações podem ser explicadas e justificadas. Eles designam e definem os valores individuais. Assim, o processo afeta os princípios e a auto-estima dos indivíduos e da organização. Ele ajuda a moldar e a sustentar a ordem social.”
Ou seja, uma decisão nunca é apenas uma decisão. Mais que isso, qualquer processo de decisão carrega em si uma contradição: para tomar boas decisões, é preciso ter mais conhecimento. O problema é que o conhecimento é um processo que costuma gerar dúvidas a um ritmo mais rápido do que fornece respostas. É de sua natureza enxergar cada vez mais complexidade nas situações. Tomar decisões, ao contrário, requer clareza, foco e confiança.
Não é à toa que os ignorantes costumam ser bem mais decididos que os sábios. Achar o ponto ótimo entre conhecimento e ação é uma espécie de gestão do próprio processo de decisão. Você quer dar conta da realidade da melhor maneira possível, mas não a ponto de paralisar o processo. Em algum momento, é preciso pôr um ponto final.
Fonte: Exame
Retirado do site: https://intellicom.com.br/2016/06/07/voce-sabe-tomar-decisao/
Gostou deste post? Então deixe seu comentário ou fale comigo pelas redes sociais!
**********
O Inspire Qualidade é um método de Incentivo, Treinamento e Educação para a Melhoria da Eficiência da Gestão de Cartórios, de forma contínua e sustentada. Foi desenvolvido em 2013 e atende Cartórios e organizações de todos os setores em todo o Brasil, criado e conduzido pela especialista Thais Ribeiro, Fundadora e Consultora da Íntegra Soluções Empresariais.
Thais Ribeiro é Mestra em Consultoria e Gestão das Organizações pela Escola Superior de Justiça (UMSA – Buenos Aires/Argentina), Administradora e Especialista em Normas Técnicas para Sistemas de Gestão e Desenvolvimento Humano. Possui 20 anos de experiência na área de Sistema de Gestão Integrado para a Excelência Organizacional, desenvolvimento da Cultura, comportamento e mentalidade humana, gerenciamento de projetos e equipe, certificações e premiações na área da Gestão. Pós-graduada em Gestão, Inovação e Competitividade. Extensão em Propriedade Intelectual. Auditora Líder das normas ISO9001 (IRCA) e Gestão Integrada (ISO9001, ISO14001, OSHAS18001, ISO26001, ISO31001, ISO37001 entre outras) e Programas Setoriais. Atua como Examinadora em Prêmios da Qualidade em diversos segmentos. Profissional certificada em Segurança da Informação e Proteção de Dados e membro certificada da ANPPD. Empreteca, Coach, Programadora Neurolinguística e Hipnoterapeuta. Contato: thais@inspirequalidade.com.br